2 de agosto de 2010 às 10:43
Datafolha e o “voto útil” para o governo de SP em 1998
Hudson Luiz Vilas Boas, no Dissolvendo no ar
E não é que os números do Ibope se aproximam mais dos divulgados pelo Vox Populi do que os do Datafolha!!!
Surpreendente!!!
Mas relembrando o passado e refrescando um pouco a memória, vamos a um episódio curioso ocorrido nas eleições para o governo de São Paulo no não tão longínquo ano de 1998. Naquele ano foram realizadas eleições gerais no Brasil e concorriam ao governo do estado de São Paulo, dentre outros, o ex-prefeito da capital Paulo Maluf (PPB), Mario Covas (PSDB) tentando a reeleição, o ex-prefeito de Osasco Francisco Rossi (PDT), o ex-governador Orestes Quércia (PMDB) e a deputada federal em primeiro mandato Marta Suplicy (PT).
Para Paulo Maluf e Orestes Quércia não dispensarei maiores comentários. Francisco Rossi tinha como base de sustentação o segmento evangélico e garantia possuir dons metafiscos capazes até de suspender congestionamentos na grande São Paulo. Marta Suplicy, como dito antes, era deputada em primeiro mandato e se ancorava na boa atuação que tivera na Câmara dos Deputados, sobretudo em defesa dos direitos humanos. O seu grande cabo eleitoral era o então marido, o Senador Eduardo Suplicy. Claro que Marta tinha luz própria e pode parecer machismo de minha parte ligá-la assim ao ex-marido, todavia é impossível negar o papel importantíssimo que o Senador, àquela época em campanha vitoriosa pela reeleição, desempenhou na campanha de Marta.
A campanha se desenrolara com uma incerteza e duas seguranças. As seguranças: Haveria segundo turno e Maluf detinha cacife o suficiente para disputá-lo graças ao nicho do eleitorado que mantivera por décadas. A incerteza: quem seria o oponente de Maluf no segundo turno.
Covas eleito em 1994 para ocupar o Palácio dos Bandeirantes detinha baixos índices de aprovação ao seu governo e não conseguia transmitir ao eleitorado motivos plausíveis para continuar a frente do governo paulista. Marta contava com parcos recursos financeiros para uma campanha daquela magnitude e lutava contra a tradicional aversão que o eleitorado paulista nutre pelo PT. Quem surgia como favorito para disputar o segundo turno contra Maluf era Francisco Rossi, um demagogo com posições bastante conservadoras e um canastrão religioso (cristão).
Na antevéspera da eleição, numa sexta-feira, 2 de outubro, o Instituto Datafolha divulgou o seguinte resultado duma pesquisa sobre intenção de voto: Maluf,31%; Rossi,18%; Covas,17%; Marta,15% e Quércia, 6%.
Maluf, bem a frente de seus adversários, dificilmente perderia a passagem para o segundo turno. Já a segunda vaga encontrava-se em aberto e seria disputada entre Rossi e Covas, com aquele tendo ligeira vantagem sobre este.
A única salvação, apontada pelo Datafolha, para impedir um eventual segundo turno entre Maluf e Rossi residia nos eleitores mais atentos e que repudiavam tanto Maluf quanto Rossi, fazerem uso do chamado “voto útil”. Esse voto útil consistia em convencer os eleitores que originalmente intencionavam votar em Marta a votarem em Covas. E em boa parte, realmente, os votos de Marta migraram para Covas antes mesmo de a candidata petista recebê-los. Não foram poucos aqueles que acreditaram piamente no Datafolha e, cheios de boa intenção e com medo dum catastrófico segundo turno entre Maluf e Rossi, se utilizaram do voto útil em prol de Mario Covas.
Transcorrida a eleição no domingo, 4 de outubro, e iniciada a apuração o que se presenciou foi um cenário deveras diverso daquilo pintado dois dias antes pelo Datafolha. Se Maluf abria vantagem sobre seus adversários e se isolara na primeira posição como já se esperava, era Marta quem surgia na segunda posição tendo Covas em seu encalço e ambos deixando Rossi bem atrás.
A apuração, que naquele ano ainda era manual na maioria das localidades, prosseguiu em clima de suspense e com fortes emoções. No final Covas ultrapassou Marta e graças a míseros 0,9% de votos a mais se garantiu no segundo turno.
Veja o resultado oficial e note como ele difere do apresentado dois dias antes pelo Datafolha: Maluf, 5.351.035 (32,12%); Covas, 3.813.186 (22,95%); Marta, 3.738.750 (22,5%); Rossi, 2.843.515 (17,11%) e Quércia 714.097 (4,1%).
O Datafolha simplesmente não acertou um único resultado em cheio. E o pior, no erro mais grosseiro o instituto deu a Marta Suplicy 7,5% menos do que ela obteve, isso numa pesquisa realizada a menos de cinco dias da eleição. O eleitor de Marta confiante no Datafolha se viu na seguinte posição: escolher entre os males o menor ou simplesmente lavar as mãos. Dá pra imaginar, depois de abertas as urnas, a cara de idiota de muitos eleitores que ludibriados pelo Datafolha deram o “voto útil” a Covas na certeza de que Marta não tinha chances de ir ao segundo turno.
Não há dúvidas que o Instituto Datafolha interferiu na intenção de voto dos paulistas naquele ano. E interferiu a favor do então governador Mario Covas, um dos lideres do tucanato que corria o risco de entrar para a História como um governador que não conseguiu se quer passar para o segundo turno na sua tentativa de reeleição – seria vexaminoso.
Mais uma vez repito o que já venho dizendo há algum tempo. É impossível medir a credibilidade dos institutos de pesquisa, em pesquisas eleitorais, simplesmente por inexistir dados que comprovem, ou não, sua veracidade faltando tanto tempo para as eleições. Contudo nesse caso especifico, a credibilidade dos serviços prestados pelo Datafolha ficou em xeque.
PS do Viomundo: Já contei a história do Datafolha em 1985, quando a pesquisa de boca-de-urna do instituto deu vitória de Fernando Henrique Cardoso numa eleição que Jânio Quadros venceu com 4% de margem. Uma pesquisa errada no dia da eleição pode ter todo tipo de efeito: de desmobilizar os eleitores de um candidato que acreditem que ele será derrotado a desmobilizar os fiscais do partido que acreditem que o candidato em nome do qual fiscalizam será derrotado. Para ler, clique aqui.
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