14 de outubro de 2010 às 19:37
por Conceição Lemes
Transparência é sine qua non em todo negócio público. Uma das formas de garanti-la é a licitação, quase sempre obrigatória. Mesmo nas situações excepcionais em que é dispensável, o contrato da minuta tem de estar disponível, on-line, para consulta. O descumprimento dessas normas tem de ser denunciado, é óbvio.
Rápida busca no Google revela que denúncias nesse setor (às vezes improcedentes) geralmente ganham destaque na velha mídia quando envolve pessoas e órgãos ligados ao governo federal ou aos aliados da base de sustentação do presidente Lula.
Essa mesma mídia, no entanto, silencia sobre as benesses que recebe da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP), via Fundação para Desenvolvimento da Educação (FDE), pela venda de apostilas, jornais, revistas, livros.
“Desde 2004, especialmente de 2007/2008 em diante, a FDE pagou no mínimo R$250 milhões (R$248.653.370,27) [valores não corrigidos] à Abril, Folha, Estadão, Globo/Fundação Roberto Marinho”, denuncia NaMaria, do NaMaria News , ao Viomundo. “A maioria sem licitação.”
“As vendas maciças desse papelório à FDE coincidem com o apoio crescente da mídia à candidatura José Serra e apoio ao PDSB”, observa NaMaria. “As publicações são apenas cortina de fumaça. Uma desculpa perfeita, pois com dinheiro do FNDE podem-se comprar tais coisas. Porém, o que a FDE comprou, de verdade, foi a palavra nesses espaços.”
“Em São Paulo, à custa da educação pública estão se construindo inúteis ‘escolas de papel’”, nota NaMaria. “Afinal, esse papelório é dispensável e o destino, o lixo. Quem não se lembra dos Cadernos do Aluno, caríssimos, feitos em editoras como a Plural (da Folha), Ibep, Posigraf, FTD, que foram encontrados em caçambas de lixo, e dos que tinham o mapa da América do Sul com dois Paraguais?”
“Quase todo o dinheiro da compra de jornais, revistas, apostilas, inclusive daquelas mochilas que o Serra alardeia nas propagandas, vem do FNDE”, revela NaMaria. “Mas a SEE-SP e a FDE omitem, fazem bonito com os donos da mídia com o chapéu do governo federal. As compras estão dentro da lei, mas será que são relevantes?”
Por exemplo, para a Editora Abril/FundaçãoVictor Civita foram entregues R$ 52.014.101,20 para comprar 4.543.401 exemplares de diferentes publicações. Com esse dinheiro, poderiam ser construídas quase 13 escolas ou 152 salas de aula novinhas, com capacidade para mais de 15 mil alunos nos três períodos – considerando que uma escola com 12 salas custe R$ 4,1 milhões e cada sala cerca de R$340 mil.
FNDE é o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, vinculado ao Ministério da Educação e Cultura (MEC). A FDE-SP, criada para cuidar da construção e infraestrutura escolar, cresceu demais, adquiriu poderes imensos, virou um buraco negro. Exceto a folha de pagamento, passa por aí desde o dinheiro para a compra de papel higiênico (suprimentos), merenda, material didático, mobiliário escolar, kits escolares (mochila, cadernos etc.), projetos pedagógicos, capacitações até o destinado para aquisição de computadores e softwares.
“A FDE sequer publica no Diário Oficial (DO) a justificativa de suas compras que dispensam de licitação”, condena NaMaria. “Até hoje encontrei poucas. Por exemplo: assinaturas do Diário Oficial, feitas pelas Diretorias de Ensino, locações de imóveis, serviços emergenciais de limpeza escolar. Mesmo assim incompletas. Outras secretarias até publicam, a Educação, não. Não é piada?”
O NaMaria News existe há um ano e meio. A “dona” é uma web-pesquisadora muito dedicada e competente, com faro finíssimo para descobrir desmandos na educação pública, principalmente os praticados pelo PSDB de São Paulo. A veracidade e excelência do seu trabalho são tamanhas que NaMaria hoje é referência.
NaMaria é uma só. Mas, por meio das redes, vira uma legião capaz de chegar a qualquer canto do Brasil. Por isso, neste segundo turno da eleição presidencial, o Viomundo entrevistou-a, para entender melhor os meandros dos negócios dos tucanos na área educacional.
Afinal, a Secretaria da Educação Estadual de São Paulo é uma das maiores empresas públicas do mundo: tem 4.449.689 de alunos (matrículas 2009), 278.443 professores ativos (comprove aqui) e execução orçamentária recorde em 2009 de R$ 1.9 bilhão (Relatório FDE).
Viomundo – Vou começar com a pergunta que todo mundo gostaria de fazer a você: como descobre tudo isso?
NaMaria – (Risos)…lendo o Diário Oficial de São Paulo. Lá temos drama, suspense, ação, ficção científica, mistério. E um pouco da realidade, que não faz mal a ninguém. Vai dizer que a notícia dada no DO de que o Alckmin, quando governador em 2003, acabaria com as enchentes do Tietê não é ficção? E que saiu por quase um bilhão de reais, com dinheiro japonês, não é de matar de emoção? Só é.
O Diário Oficial também tem muita diversão. É como se eu me movesse num enorme labirinto. Por exemplo, eu chego lá com o número de um contrato ou o nome de algum personagem histórico do mundo dos negócios. Eu tenho de seguir o rastro dele, atentando às mínimas pistas, para reconstruir as tramas. Às vezes ao “caçar” compras de jornais e revistas sem licitação, acho um contrato recém-assinado, milionário, com empresa de aluguel de computadores ou serviço de lanches, prestação de serviços em eventos.
Sem dúvida, o DO (risos, de novo) é o melhor jornal de todos os tempos. Parece ser o único que fala alguma verdade – mesmo que por outras vias. Há também os leitores que nos enviam sugestões de pesquisa, denúncias, perguntas interessantes.
Viomundo – Qual o seu diagnóstico da educação pública em São Paulo?
NaMaria – Quem mora em outro estado e vê a propaganda, acha que a nossa educação vai muito bem. Tremenda ilusão. A propaganda é bonita mas pura mentira. A educação vai péssima. O fracasso pedagógico está claríssimo. Basta conversar com pais, alunos e professores. As escolas públicas paulistas são protótipos caros de cadeias e túmulos de sonhos. As crianças e os jovens que as frequentam são o que menos importam aos gestores. Idem os professores.
Viomundo – São Paulo é o estado mais rico da federação, a Secretaria de Educação tem muito dinheiro. Por que os resultados práticos são tão ruins?
NaMaria — Dinheiro não significa qualidade. E dinheiro mal empregado, pior ainda. É a máxima do menos é mais, só que ao avesso. O fracasso pedagógico decorre da filosofia implantada aqui: a nossa educação é baseada em negócios.
Viomundo – Esse modelo começou com o Serra na Prefeitura?
NaMaria – A filosofia, não. Mas a relação desse modelo de negócio com a mídia, sim. Muitos dos meganegócios, prestações de serviços, projetos “pedagógicos”, empresas ganhadoras e práticas atuais da FDE tiveram berço com Serra quando prefeito de São Paulo.
Viomundo – Comecemos pela filosofia.
NaMaria — A educação baseada em negócios começou em Brasília, no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), quando Paulo Renato de Souza era ministro da Educação (1995 a 2001). Vários membros da equipe abriram empresas quando saíram do governo e passaram a vender serviços para o próprio governo. O próprio Paulo Renato montou a PRS Consultoria. A Veja, parceira visceral da SEE-SP, já no início da década de 90 fazia elogios rasgados à política educacional do Paulo Renato.
Em janeiro de 2005, quando o Serra se tornou prefeito, muitos deles vieram para cá para implantar o projeto de negócio em educação.
Em dezembro de 2007, já com Serra governador de São Paulo, o projeto aparece no estado. A secretária de Educação era Maria Helena Guimarães de Castro, ex-MEC e ex-secretária de Educação do Distrito Federal, do então governador José Roberto Arruda.
Daí, veio também para a SEE-SP a Iara Glória Areias Prado, ex-secretária-adjunta de Educação da Prefeitura, ex-assessora na empresa PRS do Paulo Renato, esposa do “homem das pesquisas”Antônio de Pádua Prado Júnior, o Paeco, cuja empresa APPM tem significativos clientes, entre eles a agência Lua Branca, do Luiz Zinger González, o marqueteiro atual do Serra, cuja mesma agência fez trabalhos caríssimos para o Paulo Renato na SEE e que também é Conselheiro Consultivo da Fundação Mário Covas.
Veio ainda a Cláudia Aratangy, hoje Diretora de Projetos Especiais no lugar da Iara Prado, que exerce outras funções poderosas. Veio a Guiomar Namo de Mello, que também é executiva da Fundação Victor Civita, é diretora da EBRAP – Escola Brasileira de Professores, conselheira na Sangari Brasil, está dentro da SEE/FDE – tendo sido contratada não pela Educação, mas através da FUNDAP Fundação do Desenvolvimento Administrativo – (ver também a Resolução SE – 79, de 3-11-2009) –; é da equipe executora dos Cadernos dos Professores “Gestão do Currículo na Escola” 2008-2010 e por aí vai. Daí tem também a Maria Inês Fini, Zuleika de Felice Murrie e depois Eliane Mingues, entre outros.
A lista é imensa, podemos ficar aqui uma semana enumerando-os. Detalhe: todos da turma do Paulo Renato dos tempos de MEC. Desde 2009, Paulo Renato é o secretário da Educação do Estado de São Paulo.
Viomundo – Você disse que muitas das práticas atuais da FDE tiveram início com Serra quando prefeito…
NaMaria – Te dou um exemplo. A Central de Atendimento da FDE é feita pela Call Tecnologia e Serviços, que chegou na Prefeitura de São Paulo, em abril de 2006, para fazer a Central 156. A Call foi parar, via licitação, na Educação de SP em março de 2009, para fazer um serviço que já era feito pelos funcionários da FDE: atender as chamadas telefônicas, orientar os usuários etc..
Mas o Paulo Renato e o Serra acharam por bem ter uma “empresa terceirizada mais profissional” para o serviço, para agilizar. Só que um tanto mais cara também: algo como R$ 3.984.000,00 (contrato 52/0020/09/05) – fora a tonelada de equipamentos, instalações e software que tiveram de comprar para a coisa andar direito; então lá se foram alguns milhões. E as empresas fornecedoras desses equipamentos e serviços também são velhas conhecidas tanto da prefeitura quanto do estado. Uma parte dessa aventura já foi tratada no NaMaria News (aqui). É bom não esquecer que a Call Tecnologia, original de Brasília, está na Operação Caixa de Pandora – junto com outras empresas de tecnologia, gráfica e software que negociam com São Paulo.
O Serra, na verdade, fez da prefeitura um piloto do que colocaria em prática, depois, no governo do estado. Testou tudo: tipos de negócios, projetos, mega-assinaturas de publicações da Abril, Estadão, Folha, Globo, ex-membros da equipe do Paulo Renato, até o próprio Paulo Renato. Portanto não é errado pensar que o seu governo estadual foi piloto para o que pretende fazer, se eleito como presidente. Ele gosta de um projeto-piloto.
Viomundo – Mas a Marta Suplicy (PT-SP) também comprou assinaturas revistas da Abril e outras editoras quando prefeita…
NaMaria – A Marta assim como governos anteriores. Acontece que ela comprava a maioria definitiva e comprovadamente para as bibliotecas. Quem queria ler ou consultar, ia às bibliotecas e pronto. No DO é fácil comprovar isso. Portanto, em quantidades e valores mínimos se comparados ao que vimos com Serra na Prefeitura, depois no governo do estado de São Paulo. É o caso do projeto Ler e Escrever, que surgiu na Prefeitura em 2005. Em 2007, ele apareceu na SEE-SP.
Viomundo – O que é o projeto Ler e Escrever?
NaMaria – Entre outras funções mais nobres, ele é responsável por comprar livros, sem licitação, em grandes quantidades, entre os quais aqueles noticiados em toda imprensa como “pornográficos”, tipo o Memórias Inventadas, do Manoel de Barros (463.088 exemplares, por R$ 2.315.440,00). Há editoras campeãs de vendas também — estamos levantando isso.
Mas o mais intrigante desse projeto são as compras denominadas “materiais de apoio pedagógico”. Por exemplo: dez contratos [2008-2010] de revistinhas da Turma da Mônica (e Cascão), da Panini, que custaram aos cofres públicos de São Paulo quase R$ 27 milhões, sendo um deles de R$14 milhões numa tacada.
Foram gastos R$18 milhões em revista Recreio, da Abril. Para a Ediouro, nas compras de Coquetel Picolé, foram mais de R$6 milhões.
Aí, eu pergunto. Do ponto de vista educacional-pedagógico, que utilidade tem essas revistinhas? NENHUMA. Bem, os adeptos sempre podem recorrer à faceta lúdica, mas e aí? Como é isso na sala de aula?
Da Fundação Victor Civita, a Secretaria da Educação de São Paulo comprou 18.160 assinaturas da revista Nova Escola no final de 2004 e em outubro de 2007, respectivamente. Em 2008, saltou para 220 mil assinaturas, que custaram R$ 3.740.000,00.
Curiosidade: além de ter a Nova Escola no local de trabalho, os professores passaram a receber as revistas em suas casas. O que significa que endereços e dados pessoais dessa gente foram para o banco de dados da Fundação Victor Civita, sem permissão ou conhecimento prévio de seus donos.
O NaMaria acompanhou algumas dessas aquisições do Ler e Escrever. Só para a revistinha Turma da Mônica, da Editora Panini, que já teve negócios com a Globo, a FDE pagou a ” módica” quantia de R$ 14.277.067,20.
O quadro abaixo não é completo, é apenas um apanhado do que eu consegui levantar. Mas é de desnortear qualquer um, concorda?
Panini Brasil LTDA
Contrato
LinkDiário Oficial
Valor90.000 unidades Almanaque do Cascão, 90.000 unidades Almanaque da Mônica
15/0134/08/04 (Ler e Escrever)
29/mar/2008
561.600,009.000 Assinaturas Revista da Turma Mônica
15/0135/08/04 (Ler e Escrever)
29/mar/2008
1.422.900,00103.092 avulsas: 51.546 Almanaque do Cascão e 51.546 Almanaque da Mônica
15/0695/08/04 (Ler e Escrever)
29/mai/2008
321.647,045.155 Assinaturas Revista Turma da Mônica
15/0694/08/04 (Ler e Escrever)
12/ago/2008
815.005,50Livros títulos diversos ficção e não-ficção para 2ª, 3ª e 4ª séries do Ciclo I
15/1045/08/04 (Ler e Escrever)
14/out/2008
47.946,3057.310 assinaturas da Revista Turma da Mônica
15/0147/09/04 (Ler e Escrever)
2/abr/2009
14.277.067,2034.938 assinaturas Turma da Mônica Jovem e 279.504 unidades avulsas nº 1 ao 8 Turma da Mônica Jovem
15/0146/09/04 (Ler e Escrever)
17/abr/2009
4.373.538,84195.749 unidades Almanaque do Cascão e 195.749 unidades Almanaque da Mônica
15/0148/09/04 (Ler e Escrever)
17/abr/2009
1.291.943,4011.295 assinaturas da Revista Turma da Mônica
15/0502/09/04 (Ler e Escrever)
6/ago/2009
2.344.842,00392.000 avulsos do Almanaque da Turma da Mônica (196.000 do Cascão, 196.000 da Mônica)
15/00549/10/04 (Ler e Escrever)
23/jun/2010
1.332.800,00Total
26.789.290,28Ediouro Ltda
Contrato
Link DO
Valor126.000 assinaturas Revista Coquetel Picolé (+ o aditamento ver DO 14/maio/08)
15/0180/08/04
2/abr/2008
1.892.062,80132.244 assinaturas Revista Coquetel Picolé
15/0185/09/04
20/mai/2009
3.023.097,8462.129 assinaturas Revista Coquetel Picolé
15/0529/09/04
26/ago/2009
1.183.557,45Total
6.098.718,09
Viomundo – NaMaria já denunciou a compra de outras assinaturas, como Veja, Estadão, Folha, IstoÉ, Época, Galileu… Tem ideia das justificativas para as compras e de quanto o governo de São Paulo pagou nos últimos anos às empresas que fazem essas publicações?
NaMaria – Raramente se encontra no Diário Oficial os contratos dessas compras, apesar de ser obrigatória a publicação bem como a justificativa, portanto não sabemos porque essa e não outra e tal. Mas sobre gastos dá para ter uma noção maior, desde que esteja tudo publicado. De modo que o meu apanhado é apenas de uma parte do dinheiro gasto. Pelas pesquisas do NaMaria, desde 2004, especialmente de 2007/2008 em diante, foram entregues no mínimo R$250 milhões (R$248.653.370,27) [valores não corrigidos]. Sem dúvida é mais do que isso, mas já dá para fazer uma reflexão.
Se pegarmos as compras feitas pela FDE à Abril (Guia do Estudante Vestibular, Atlas Nacional Geographic, Revista Recreio e Veja) e Fundação Victor Civita (Revista Nova Escola), em contratos sem licitação que o DO aponta desde 2004 até agora, teríamos a quantia de R$52.014.101,20 (tabela abaixo).
Com o mesmo dinheiro entregue à Abril/Civita, sem qualquer percalço licitatório, em troca de papel, poderíamos construir quase 13 novas escolas ou cerca de 152 salas de aula, com capacidade para mais de 15 mil alunos nos três períodos (manhã, tarde e noite). Desafogaríamos as escolas existentes e atenderíamos dignamente os alunos e comunidades.
Editora Abril / Victor Civita
Contrato
Link Diário Oficial
Valor18.160 assinaturas (renovação) Revista Nova Escola (DE’s/Ofs.Pedags/Escolas) SÓ HÁ 2 REGISTROS EM DO e eles falam em renovação – onde, quando o contrato inicial?
42/2199/04/04 (ver DO 29/12/04)
14/jan/05
326.880,0018.160 assinaturas (renovação) Revista Nova Escola
15/1063/07/04
23/out/2007
408.600,00220.000 assinaturas da Revista Nova Escola – edições 216 a 225 (solicitado pela CENP para o “Ler e Escrever”)
15/1165/08/04 (ver DO 1/10/2008)
25/out/2008
3.740.000,004.475.480,00
415.000 exemplares Guia do Estudante Atualidades Vestibular 2008
15/0543/08/04
23/abr/2008
2.437.918,00430.000 exemplares Edições nº 7 e 8 do Guia do Estudante Atualidades Vestibular
15/1104/08/04
22/out/2008
4.363.425,00430.000 Guia do Estudante Atualidades Vestibular Ed.08 + 20.000 Revista do Professor
15/0063/09/04
11/fev/2009
2.498.838,00540.000 Guia do Estudante Atualidades Vestibular Ed.09 + 25.000 Revista do Professor
15/0238/09/04
16/jun/2009
3.143.120,00540.000 Guia do Estudante Atualidades Vestibular Ed.10 + 27.500 Revista do Professor
15/0614/09/04
29/ago/2009
3.249.760,00540.000 Guia do Estudante Atualidades Vestibular 2º sem2009 + 27.500 Revista do Professor
15/00024/10/04
2/abr/2010
3.177.400,00540.000 Guia do Estudante Atualidades Vestibular Ed.11-2º sem2010 + 27.500 Revista do Professor N.5
15/00473/10/04
15/jun/2010
3.328.600,00540.000 Guia do Estudante Atualidades Vestibular Ed.12-2º sem2010 + 27.500 Revista do Professor N.6
15/00762/10/04
17/ago/2010
3.328.600,00
25.527.661,003.000 assinaturas Revista Recreio
15/0181/08/04 (Ler e Escrever)
29/mar/2008
1.071.000,006.000 assinaturas Revista Recreio
15/0182/08/04
29/mar/2008
2.142.000,005.155 assinaturas Revista Recreio
15/0670/08/04
12/ago/2008
1.840.335,0025.702 assinaturas Revista Recreio
15/0149/09/04
17/abr/2009
12.963.060,722.259 assinaturas Revista Recreio
15/0528/09/04
1/set/2009
891.220,6818.907.616,40
95.316 Atlas Nacional Geographic vols. 1 a 26, sendo 3.666 exemplares de cada volume
15/00273/09/04 (Sala de Leitura)
28/mai/2010
733.200,005.200 assinaturas da Revista Veja
15/00547/10/04 (Sala de Leitura)
29/mai/2010
1.202.968,005.449 assinaturas da Revista Veja
15/0355/09/04
20/mai/2009
1.167.175,803.103.343,80
52.014.101,20
Viomundo – Impressão ou as compras de “papéis” da SEE-SP são uma barafunda?
NaMaria – Não é impressão. É real. Se analisarmos os últimos 16 anos dos tucanos na educação em São Paulo, você descobrirá que não há um projeto verdadeiro de educação. Há “projetos”, para atender “interesses” de A ou B.
O universo das compras da SEE-SP é monumental, compra-se de tudo. E isso facilita compras de papelório de editoras, gráficas, fundações vinculadas aos meios de comunicação.
Aliás, as vendas maciças de papelório à FDE coincidem com o apoio crescente da mídia à candidatura José Serra e apoio ao PDSB. As publicações são apenas cortina de fumaça. Uma desculpa perfeita, pois com o dinheiro do FNDE podem-se comprar tais coisas sem grandes problemas. Porém, o que a FDE comprou, de verdade, foi a palavra nesses espaços.
Viomundo – Daria para clarear essas compras de papelório?
NaMaria – São confusas, mesmo. Muitas coisas são para os alunos, pelo menos são compras que pertencem a “projetos” criados para os alunos. É o caso dos livros do Ler e Escrever, também os do Salas de Leitura.
Tem muito projeto para incentivar a leitura, mas a biblioteca é um horror na maioria das escolas. Ou falta espaço físico, pois ela passa a ser um depósito de computadores “velhos”, apostilas “velhas”, materiais em geral. Ou há desinteresse administrativo. Ou, ainda, falta de competência mesmo. Criaram então um “projeto” em que os alunos levam os livros para casa e fazem sua própria biblioteca, eles não ficam na escola.
O que se vê em todos é um gasto fenomenal de dinheiro, algumas vezes com escolhas inapropriadas para idade/série. Não há dúvida de que é bacana o aluno, sobretudo o mais carente, ter sua pequena biblioteca, mas infelizmente há mais coisas envolvidas.
Viomundo – Esses livros são “trabalhados” nas salas de aula?
NaMaria – Não dá para saber ao certo, embora a SEE crie materiais (e capacitações presenciais e on-line), ensinando os professores a usar os materiais que coloca nas classes.
Eu gostaria muito de saber como são usadas, por exemplo, as centenas de milhares de exemplares do Guia do Estudante Atualidades Vestibular e a Revista do Professor – Atualidades, da Abril. Elas são “primas” e caminham juntas. Se a gente olhar por alto alguns contratos, entre 2008-2010, vemos os gastos de mais de R$25 milhões. Mas como, exatamente, funcionam na escola não há registro por parte da SEE-SP ou da FDE. São informações que não chegam ao público comum.
No entanto, é facílimo averiguar. Não para nós, claro. Basta um grupo de deputados – eles têm passe livre – ir até algumas escolas, e analisar construções, mobiliários, reformas, livros, apostilas, computadores, merenda, entre outras coisas. Escolham as mais distantes, evitem as mais próximas ou as consideradas “melhores” pelo padrão FDE. E cheguem sem avisar, principalmente. Depois, divulguem amplamente os resultados. Duvido que tudo esteja o mar de rosas que a Secretaria da Educação de São Paulo anuncia nas propagandas.
Viomundo – Qual a sua avaliação dos tais Caderno do aluno [tem também o Caderno do professor], que são apostilas como as de cursinho pré-vestibular?
NaMaria – Os Caderno do aluno são considerados materiais pedagógicos. Apoiado pelo mesmo pessoal que o acompanha desde o MEC, o Paulo Renato achou bacana ter essas apostilas. A FDE fez licitações para a impressão [serviços gráficos], contratou professores especialistas em cada área, montou equipe interna de técnicos e mandou ver, como o NaMaria mostrou (aqui) em novembro de 2009.
O estarrecedor, como sempre, foi a quantidade de dinheiro entregue às seis gráficas ganhadoras, entre elas aquela metida com o vazamento do ENEM, a Plural, do grupo Folha. Até novembro de 2009, a Secretaria da Educação, via FDE, havia entregado às empresas quase R$84 milhões [valores não atualizados]. A Plural foi a que mais recebeu: R$28 milhões. Fez inclusive apostilas que não estavam no edital. O levantamento precisa ser atualizado em 2010, algumas gráficas saíram, outras entraram e os valores certamente são outros. É preciso acrescentar muito dinheiro à essa conta.
Caderno do Aluno – gráficas
Caderno do aluno – Editora FTD (Artes e Ciências)
36/2912/08/05
Ver NM
12.554.353,96Caderno do aluno – Ibep (Geografia e Filosofia)
36/2912/08/05
Ver NM
12.996.463,72Caderno do aluno – Esdeva (Física e História)
36/2912/08/05
Ver NM
13.572.846,25Caderno do aluno – Multiformas (Matemática e Sociologia, mas caiu fora – fica Plural)
36/2912/08/05
Ver NM
3.386.494,74Caderno do aluno – Posigraf (Inglês e Química)
36/2912/08/05
Ver NM
13.286.501,68Caderno do aluno – Plural (Bio/Port/Mat/Sociol/Educ.Física)
36/2912/08/05 + 36/1641/09/05
Ver NM
28.113.283,98Total
83.909.944,33
Viomundo – O que sabe mais dos tais Caderno do aluno?
NaMaria – Além do mapa com dois Paraguais, de eles terem sido encontrados em caçambas de lixo, os alunos criaram sites com as respostas. Por exemplo, recentemente teve o caso do link que levava os alunos ao impróprio Naked News em vez de site de conjunto de jornais. O NaMaria foi o primeiro a divulgar isso, lembra-se?
Os professores da rede também criticam abertamente a qualidade desses materiais. Pelo que observo na internet, a maioria não os utiliza em sala de aula, mas representantes da FDE já anunciaram a continuidade das publicações – sabe-se lá até quando. É um belo negócio, esse do ensino apostilado.
Viomundo – As editoras privilegiadas por essas compras têm também gráfica. É só coincidência?
NaMaria -- As compras gráficas realmente merecem carinho especial. Se a SEE-SP tivesse gráfica, ela seria das maiores do Brasil. O estado tem a Imprensa Oficial, que poderia — e é usada pela SEE – mas nada se compara aos contratos com empresas privadas. Por exemplo, a Positivo começou como gráfica e hoje, muito graças à Secretaria da Educação de São Paulo, é uma gigante na informática. Para comprovar, basta seguir a história da empresa no DO desde o começo da informatização mais pesada do estado. A Positivo tem a Posigraf, que presta serviços de milhões e milhões à SEE-SP. Não podemos esquecer que bobina de papel é dinheiro disfarçado, faz milagres em eleições, sabia?
Viomundo – E as assinaturas dos jornais Folha e Estadão, Veja, Nova Escola, IstoÉ, Época…?
NaMaria — Dizem que são “materiais” para uso nas salas de professores, na administração e, claro, como apoio em sala de aula. Mas novamente não sabemos como isso se dá, nem qual a justificativa legal para tais compras. Como esses contratos dispensam licitação, não aparecem em DO, embora devessem. Por isso não sabemos a justificativa. Dá só para a gente imaginar – e ninguém pode reclamar se imaginarmos errado.
Quer outro exemplo de absurdo? Há um certo curso de idiomas que está acontecendo agora, outro projeto-piloto. A SEE-SP contratou algumas empresas particulares para fazer o que os professores da rede deveriam fazer: ensinar idiomas aos alunos estaduais. Mas como o projeto chama-se Programa de Aperfeiçoamento em Idiomas, fica parecendo que está tudo correto. Mas ele é muito estranho. Além de uma das empresas, a Multi Treinamento e Editora Ltda, estar em todo canto, pagam mais às empresas terceirizadas do que aos professores públicos. O NaMaria está pesquisando isso.
Viomundo – Da perspectiva de educação tem sentido a compra desse papelório?
NaMaria – Nem todas as compras parecem ter sentido. Sobretudo as feitas sem licitação, como aquelas das assinaturas de Veja, IstoÈ, Época, Folha, Estadão, El País e jornais do interior que mostrei no blog (aqui).
Há pedidos de informação na Assembleia. Há casos em investigação no Ministério Público de São Paulo. Mas não se sabe muita coisa, pois não publicam, demoram demais.
O fato é que o Tribunal de Contas aprova a maioria dessas compras sem ressalvas, julgam “regulares” e ponto. Quando ocorre o inverso, raras vezes, algo se passa que acabam bem da mesma forma, justificam-se as compras e tal. Mas como não temos acesso público às justificativas, sejam quais forem, a incógnita permanece.
Não há tanta transparência assim quanto dizem. Qual o sentido de se comprar só a Veja sendo que há a Carta Capital no mercado também? Por que apenas a Nova Escola se temos a Carta na Escola? Por que não licitar entre as editoras? Qual o sentido de gastar muitos milhões em Microsoft se há softwares livres ou outros que fazem o serviço melhor que os da Microsoft? Por que lançar um programa de venda de computadores para professores e nas máquinas estarem instalados o sistema operacional e as montanhas de tranqueiras da Microsoft que jamais serão usadas?
Ou seja: lançam um programa de “computadores mais baratos” e eles são de marca fornecedora da FDE há séculos (Positivo, por exemplo), com sistema operacional Microsoft e por aí vai. Por que criar apostilas cujos conteúdos são um tanto problemáticos, além de caríssimas, em vez de manter os livros aprovados pelo MEC e ao gosto do professor e seu currículo? Creio que estas e outras perguntas deveriam ser respondidas pelos professores e, logicamente, pelos alunos.
Viomundo – E a Globo onde entra nessas compras da FDE?
NaMaria – Via Fundação Roberto Marinho. Aí, há as apostilas do Telecurso, além dos cursos técnicos comprados pelo Estado. Ou através da Editora Globo, que vende livros, revistas… Pelo que achei até agora temos o pequeno valor de R$54.184.737,71 – entre os anos de 2005 e 2010. Bom, né?
Viomundo – Todas essas compras são feitas sem licitação, mesmo? Isso não seria irregular?
NaMaria – A maioria é sem licitação. A lei da inexigibilidade de licitação – artigo 25 inciso I, da Lei 8666/93 — permite isso. A questão é que os contratos, mesmo sem licitação, e a respectivas justificativas deveriam estar no Diário Oficial. Pelo menos esses negócios ficariam mais transparentes. Mas isso não acontece na maioria dos casos. Como eu já disse: as outras secretarias até publicam no DO, a da Educação, raramente. Estranho, não é?
Poderíamos pensar em “ilegalidade” já que frequentemente há similares no mercado. Mas isso não é respeitado ou considerado.
Por outro lado, como se explica a compra por licitação dos materiais do Telecurso da Fundação Roberto Marinho para as escolas técnicas e os supletivos? O Namaria tratou disso (aqui). Por que fazer licitação para um material que somente a Fundação Roberto Marinho faz? Por que sempre entre as mesmas três gráficas licenciadas?
A gente tem de se esforçar e crer que são totalmente legais ou o mundo estaria perdido. Mas é preciso analisar mais profundamente. Por exemplo, há casos de licitações bastante estranhos. O certame para fazer “eventos” é um deles. Tudo indicava um ganhador, uma empresa campeã de contratos, a Objetiva, que é do Eduardo Graziano — irmão do Xico Graziano, funcionário público do governo FHC (assim como o irmão), e depois do Serra. A Objetiva sempre levava todas no mundo governamental, é muito influente.
Por mais que eu leia o DO, os editais e tudo mais, menos entendo esse caso. Nós publicamos no NaMaria o lançamento do edital em 18/agosto/2009 e contamos parte da história, baseada nos documentos oficiais. Apostamos na Objetiva, porque o histórico da empresa sugeria a vitória certa. Mas, no final ela perdeu. Publicamos novo texto com maiores levantamentos. Às vezes quem perde é mais empolgante do que quem ganha. Realmente foi algo “inexplicável”, entende?
Os editais, quando há licitação e são dispostos ao público, mostram muito mais do que se imagina. As compras de software, sempre Microsoft, são impressionantes. Há especificações tão “específicas” que sugerem que são dirigidas.
Aliás, se lermos com atenção as entrelinhas desses “projetos”, acompanharmos o que rezam os editais e conversarmos com professores e alunos, fica patente a filosofia da SEE-SP. Primeiro, vêm os “negócios”, depois o planejamento.
Viomundo – E agora?
NaMaria – Estamos diante de uma situação, cada vez mais preocupante. Há, por exemplo, um grupo de fornecedores específicos que estão no estado há muito tempo. Mesmo com reclamações, multas, serviços péssimos, eles continuam. As empresas camaleão também estão presentes. Empresas que fazem negócios em nome de outras que foram de fato ganhadoras, também – é o caso das antenas parabólicas, do Alckmin, que tem no blog. Ou seja: há uma espécie de terceirização até nisso.
O fato é que, embora tenhamos dinheiro e profissionais para tornar a educação pública de São Paulo equivalente às melhores existentes no mundo, os “negócios” tornaram-na um lixo. É necessária uma devassa nos contratos da FDE e da SEE-SP. Quem vai fazer isso com isenção e seriedade necessárias? Lanço aqui no Viomundo este desafio.
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