A relação entre Serra e a mídia colonizadora chega a ser promíscua. A blindagem dada ao presidenciável na questão da greve dos professores de São Paulo é apenas uma amostra dessa escandalosa ligação. O jornalismo controlado por grupos que se beneficiaram da ditadura para sobreviver e crescer tornou-se um dos principais instrumentos contra a democracia. A estratégia é simples. Notícias ruins ao ex-governador surgem de forma picada e esporádica, sem opinião. As opiniões, quando em jornais, dão o tom editorial, as manchetes manipulam o conteúdo, e o texto desqualifica os adversários como os professores que passaram a baderneiros em campanha eleitoral. Na Globo, a especialidade é a edição de imagens, se valendo do princípio em que uma imagem vale mais que mil palavras. Outra estratégia é se utilizar de porta-vozes no rádio e na tv, como Arnaldo Jabor, Gilberto Dimenstein, Lúcia Hipólito, alguns com conhecimento do assunto, outros, longe disso, mas todos com o mesmo objetivo.
Em tempos em que as pessoas se alimentam de informações como em um fast food, fica fácil deformar opinião, não somente por meio de mentiras, mas de asneiras, mesmo. Dimenstein, na Folha, chamou os professores de baderneiros, na rádio CBN disse que o professor mesmo não faria aquilo. Naquela sexta-feira, em frente ao Palácio dos Bandeirantes, seriam figurantes contratados, os milhares de manifestantes presentes? Acusar a greve dos professores, de política e eleitoral, é brincar com a ingenuidade de leitores, telespectadores e ouvintes. Somente desavisados podem imaginar que a organização de trabalhadores não pode e não deve ser política. Mesmo na Folha, em sua coluna de 1º de abril, Jânio de Freitas disse: "É legítimo, e da própria definição de sindicato, que participe da vida política com a posição mais conveniente à classe." E complementa, reproduzindo o editorial do próprio jornal no dia anterior que legitima os motivos: "desde 2005, os professores paulistas receberam apenas 5% de aumento salarial, contra uma inflação de 22% no período”. Qualquer trabalhador público, mesmo os que não participam do movimento sindical, sabem que ano de eleição é hora de apertar, utilizando a mesma lógica que Serra usou ao deixar inaugurações e investimentos para o momento eleitoral. Porquê a indignação da mídia quanto ao oportunismo eleitoreiro não atacou o Governador. Seria apenas mais uma opinião a do jornalista Dimenstein, se sua fundação (Associação Cidade Escola Aprendiz) não recebesse do governo demo-tucano, mais de 3, 7 milhões de Reais para seus projetos (leia em mais em Amor com amor se paga - Lição de um aprendiz esperto).
Não precisava sequer uma greve como motivo suficiente para a mídia cumprir sua obrigação de realizar um balanço da educação paulista há mais de 14 anos sob administração tucana. Mas se restringem a divulgar a concepção do partido quanto ao que entendem por educação, responsabilizando o professor. Não recomendo comparações entre o setore público e o privado, já que o primeiro não deve prever lucros, mas imaginem uma empresário falindo e que responsabiliza seus operários. Essa confusão (intencional, na verdade), já se tornou comum dede a era FHC, quando queria, com Serra, privatizar a Petrobras. Graças ao fracasso de suas tentativas, a estatal pulou de 118º lugar em 2002 para 3ª entre as maiores das Américas, em 2009, crescendo seus lucros em 900% até 2008, e seu valor de mercado em 1250% até 2009, maior que o da Vale privatizada por FHC (lei mais em As farsas dos privatistas).
Como não há espaço ainda (e tomara, nunca), para os tucanos privatizarem a educação, a ideia tem sido aplicar modelos parciais do setor privado, como a meritocracia, ou seja, valorizar professores pelo resultado da educação. Essa lógica (que não traz nenhuma novidade pois repete experiências do governo militar) parte do princípio que os professores serão promovidos pelo seu mérito, como se passasse pelas mãos do professor, todo o processo educacional, que vai da política (de gestão e financeira) da Secretaria de Educação à relação da escola com a comunidade, passando pela estrutura educacional. Essa visão nada mais é que a concepção capitalista em que o professor apenas vende ao estado um produto, descartando e ignorando as relações sócio-históricos e classistas existentes. Como argumenta a Doutora em educação da Universidade de São Paulo (USP), Lisete Arelaro, "O professor é variável fundamental no processo, mas não é a única" (veja a matéria O professor vem sendo injustamente culpado pela situação educacional?). A Dra. Lisete defende: "Existe uma política hoje de encontrar um culpado para tudo e esse dedo está apontado para o professor. Geralmente quem faz isso são os governos, falta eles olharem para si próprios". Mas lembra a entrevistada prela repórter da Agência Brasil, que apesar de não ser único ator, um professor valorizado traz melhorias na qualidade da educação, meta que para ser alcançada exigiria maiores investimentos, o que, segundo Lisete Arelaro, não acontece, e "Estamos colhendo os resultados negativos de muito discurso e pouco recurso".
A professora lembra que aspectos pouco discutidos como o número de alunos por professor e até mesmo o espaço físico das salas de aula influenciam no processo de aprendizagem. Todos esses fatores não são abordados pela mídia e o Governo de São Paulo continua superlotando salas com 40 alunos, delegando aos professores a responsabilidade pelo milagre que não acontece. Para piorar, explora a mentira dos dois professores por sala, uma falácia baseada em alguns estagiários que estão em aprendizado.
Tantas tentativas de responsabilizar o professor no Estado de São Paulo, apoiadas pela mídia, vem de uma conclusão que não há discordância: a qualidade na educação paulista vem declinando e a pirotecnia tucana não alcançou efeitos. No quesito salário de professores, a Folha, no último dia 1º em um artigo de Antonio Gois, alega que os salários por si não garantem a qualidade da educação, citando Estados com melhores salários e piores resultados, bem como o contrário. Isso somente demonstra que o processo educacional depende de inúmeras variáveis. Por outro lado, o próprio artigo defende a tese que melhores salários atraem melhores profissionais (lógica do setor privado que o PSDB esquece de adotar). Apesar de não se aprofundar nos problemas da educação, a matéria traz um dado interessante no gráfico, mas sem comentá-lo. São Paulo, a velha locomotiva em desaceleração, está em 14º lugar, dentre os Estados da Federação, em termos de valor da hora-aula paga ao professor, com queda de 3 posições desde 2007.
Mas não é só nos professores mal pagos que Serra já tentou botar a culpa. Em 2006, ainda candidato a Governador, o tucano, no SPTV, creditou os maus resultados da educação paulista aos "migrantes" que vêm para o Estado. Sem nos determos à questão da discriminação, vemos que ora, a culpa é do professor, ora, do aluno. Podemos esperar o quê, de quem governa para elites? Tanto é que 47,65% dos 15.598 que tinham internet em 2006, liam UOL e responderam a enquete concordaram com o então, futuro Governador. E não se pode discordar. Mercadante tentou à época. Demonstrou que entre 1999 e 2004, mais gente saiu de São Paulo, do que entrou, e chamou a postura de "discriminação contra brasileiros que ajudaram a desenvolver o Brasil". Mas Serra, o intocável, conseguiu uma liminar para tirar do site do candidato do PT a afirmação de que Serra revelaria um "posicionamento conservador e odioso" e "um preconceito inaceitável", com direito de resposta e tudo. Toda essa polêmica ainda pode ser acompanhada no Eleições UOL 2006. Vale só lembrar que as ondas de migrações para São Paulo e Rio de Janeiro, revelam um país que historicamente, inclusive na gestão FHC, pouco investiu na região Norte e Nordeste. Porém, houve refluxo das migrações, por um lado com a economia em queda e o aumento do desemprego no Brasil até 2002, em especial nas regiões metropolitanas, por outro lado, desde 2003, o Norte e o Nordeste do país, cresceram mais que a média brasileira. Enquanto isso São Paulo sofreu queda e estagnação econômica (veja o que diz Mario Pochmann, para quem a solução para o Estado está na educação).
Em 2008, a culpa passou a ser do Alckmim, afinal nem sempre o Serra está errado. Conforme a Folha de 16/07/08, "o governo paulista não conseguiu cumprir nenhuma das quatro metas a que se propôs para a melhoria na qualidade do ensino na rede estadual, para o período entre 2004 e 2007". Em 3 dos 4 índices, caiu o que deveria subir e subiu o que deveria cair. Explica o jornal, "o objetivo era, no geral, reduzir a repetência e a evasão dos alunos, tanto no ensino fundamental (1ª a 8ª série) quanto no ensino médio (antigo colegial)". Como explicação Serra citou ao tribunal de contas, “a falta de parâmetros curriculares estaduais ”dentre os principais motivos para não ter atingido as metas, o que segundo a Folha, foi uma crítica indireta aos governos anteriores (também tucanos). Mas Serra, como apontou a própria Folha, achou uma saída: reduziu as metas para o período de 2008 a 2011. A Secretária de Educação à época, Maria Helena Guimarães de Castro, não quis dar entrevista, se limitando a uma nota que dizia que a situação de 2004 era diferente de 2008. Com certeza: era pior.
Mas a ex-Secretária resolveu falar no momento "eleitoreiro" da greve, com artigo publicado pelo Estadão no dia 02 de abril, intitulado Fatos e mitos da educação básica de SP. Ela reclama das matérias recorrentes sobre o "desastre da educação paulista" (segundo ela, um mito), inclusive entre especialistas da área (quem mais deveria formar esse tipo de opinião?). Destaca que são "raras as análises que destacam os avanços dos últimos anos e indicam a evolução dos principais indicadores educacionais". São raras e feitas pelo próprio governo. Além de números fragmentados, como exemplos em 2009 dos avanços de Serra (o que ela trata como fatos), apresenta no artigo, os resultados do IDESP (Índice de Desenvolvimento da Educação) e do SARESP (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar), ambos criados pela própria administração tucana. São eles se avaliando. Para se referir aos "fatos" de órgãos federais, lembra que São Paulo é Estado, segundo o MEC, com menos reprovações. Só não citou a distorção criada pela administração PSDBista que transformou progressão continuada em aprovação automática. Os alunos continuam sem saber ler, escrever, interpretar textos entre outras aberrações. Mesmo as melhoras, segundo os próprios critérios trazem situações interessantes que a ex-Secetária não expôs. Em 2008, segundo o SARESP, o desempenho em Português caiu para as 4ª, 6ª e 8ª séries, mas melhorou em matemática. Em 2009, houve avanço em Português e queda em matemática, na média. É essa a consistência da política educacional de Serra e dos seus acertos tratados como fatos por sua ex-secretária?
Fato é que se não são blogueiros e jornalistas que pela internet podem romper a blindagem do presidenciável tucano, podemos esperar sentados, à frente da televisão, ouvindo o rádio do carro, ou lendo jornal no banheiro (local adequado para alguns tabloides), que um balanço sério sobre a administração serrista não vai vir à luz. Permanecerá o obstinado, ou melhor, obcecado Serra, intocável.
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