10 de setembro de 2010 às 0:33
por Luiz Carlos Azenha
Gastei meia hora de meu precioso tempo noturno, ontem, para testemunhar ao vivo o Jornal Nacional.
Teve a leveza e a graça de uma autópsia.
O Jornal Nacional faz de conta que não estamos às vésperas de uma eleição histórica. Para o JN, o Brasil é um grande cenário, onde as estrelas da Globo são os protagonistas. Elas cortam os céus a jato, se protegem da chuva na cabine e usam o povo como coadjuvante para suas grandes descobertas: potiguar, sei agora, é comedor de camarão.
Higienicamente separados da cobertura política por um bloco inteiro de notícias, os artistas da Globo preocupados com a eleição não se misturam com a política partidária, que isso é coisa de bandido.
O bloco de cobertura de eleições é o bloco policial do JN.
A polícia paulista mostra serviço apurando a quebra de sigilo fiscal, que é o centro da cobertura “política” da Globo. Em seguida, os candidatos são usados como meros coadjuvantes para fazer jogo-de-cena no roteiro de Ali Kamel.
Falam José Serra e Marina Silva, martelando tudo o que já disseram dezenas de vezes ao longo dos últimos dias. Por último, Plínio de Arruda Sampaio dá seu recado de alguns segundos. É a “democracia”, versão JN.
Essa paródia jornalística nos é apresentada como “jornalismo imparcial”.
Com o cuidado de omitir toda e qualquer informação que possa jogar alguma luz sobre o momento. Ontem foi um dia especialmente farto em números da economia: as vendas de cimento cresceram 14,6% de janeiro a agosto; as vendas de material de construção devem crescer 11% em 2010; “Um milhão de brasileiros deixam a pobreza mesmo com a crise”, diz a FGV; Caixa Econômica Federal vai emprestar 70 bilhões em 2010 para a habitação, diz o G1. E por aí vai.
Mas, presumivelmente para não ajudar a candidata do governo, o JN simplesmente suspendeu as “notícias boas” — como, aliás, já fez em 2006 (Marco Aurélio Mello, então editor de Economia do JN na praça econômica mais importante do Brasil, recebeu ordens do Rio de Janeiro para “tirar o pé”).
Ou seja, se de fato Dilma Rousseff vencer pela margem que se imagina que vá vencer, em primeiro turno, o público cativo do JN certamente será pego de surpresa.
Seria exagero imaginar que Ali Kamel criou esse deserto jornalístico noturno apenas para ver brilhar a flor da indignação ensaiada de José Serra.
Hoje, ainda sem falar uma palavra, o neto da Dilma roubou a cena. Foi a “notícia política” da noite.
Além de conhecê-lo, nessa meia hora fiquei sabendo que o Ernesto Paglia gosta de comer camarões, que o sorteio do destino do jatinho é “honesto” e que a proposta do Serra… qual é mesmo a proposta do Serra?
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